A entidade que representa o setor industrial brasileiro preparou uma série de propostas para apresentar aos candidatos à Presidência de República este ano, com o objetivo de estimular a economia a partir de 2023. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) quer que a próxima equipe econômica foque em uma reforma tributária, superando um impasse de três décadas, mantenha o teto de gastos e promova mais crédito para os pequenos.
Entre as demandas dos industriais, a que causa mais controvérsia é a manutenção do teto de gastos, política instituída pelo governo de Michel Temer (MDB) em 2017, limitando os gastos públicos por 20 anos ao crescimento na arrecadação.
Entre os candidatos presidenciais que já se manifestaram sobre o tema, apenas Simone Tebet (MDB), que patina nas pesquisas, fez defesa enfática da medida de aperto fiscal. Lula (PT) e Ciro Gomes (PDT) falam em derrubar o teto, e Jair Bolsonaro (PL) admite “mexer” nele em um eventual segundo mandato.
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Os pedidos da CNI
Para os industriais, a próxima equipe econômica precisa manter o equilíbrio fiscal e combater a inflação, mas ao mesmo tempo ampliar o acesso ao crédito. “A estabilidade macroeconômica é essencial, porque cria o ambiente de estabilidade. Sem estabilidade, é impossível traçar o caminho que leva ao crescimento econômico”, diz o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade.
“É unânime que o sistema tributário precisa ser mudado e com urgência. O Brasil discute a reforma da tributação sobre o consumo há mais de 30 anos. Não podemos continuar a perder oportunidades, porque é a população quem mais perde”, completa.
Uma maior abertura para a integração brasileira à economia mundial, com maior participação nas cadeias globais de valor, também está entre as demandas da CNI. “Esse caminho, passa, preferencialmente, por uma abertura de sua economia realizada por meio de acordos comerciais e de investimentos, o uso de instrumentos de defesa comercial e combate ao comércio ilegal e o enfrentamento de barreiras às exportações”, diz comunicado divulgado pela entidade.
Que reforma?
A necessidade de uma reforma tributária no Brasil é praticamente consensual da direita à esquerda, mas disputas sobre como fazê-la têm travado avanços nas últimas décadas. Para a CNI, a proposta enviada pelo governo Bolsonaro ao Congresso em 2019, a PEC 110, representa as ambições do setor produtivo.
A PEC 110, porém, não teve força para avançar ao longo da atual legislatura, apesar de o governo federal contar com confortável maioria no Congresso. No momento, a PEC está parada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Os estudos da CNI avaliam que a PEC “tem o potencial de acelerar o ritmo de crescimento de todos os setores econômicos (agropecuária, indústria e serviços) e, consequentemente, da economia como um todo”.
Para os industriais, é preciso combater a “cumulatividade” tributária, que, para eles, gera desvantagem ao empresário nacional na competição com o mercado mundial, que seria menos injusto no setor tributário.
A CNI pede a substituição dos atuais tributos incidentes sobre o consumo (PIS/Cofins, ICMS, ISS e IPI) por dois tributos sobre valor agregado (do tipo IVA), um federal e outro subnacional (de estados, DF e municípios).
A entidade pede, porém, a manutenção do tratamento tributário subsidiado à Zona Franca de Manaus e às micro e pequenas empresas.
Mais crédito para os pequenos
Outro problema estrutural da economia brasileira que a CNI espera que a próxima equipe econômica resolva é a dificuldade de acesso ao crédito para os pequenos e microempresários. Segundo a entidade, em dezembro de 2020, as micro e pequenas empresas respondiam apenas por 18% das carteiras de crédito de instituições financeiras, enquanto as de médio porte representavam 24%. As grandes, por sua vez, abocanhavam 58% do crédito tomado.
“Para mudar esse quadro, três pilares são fundamentais: a redução de custo do crédito bancário e a ampliação de seu acesso; o aprimoramento do crédito não bancário; e o aprimoramento das políticas de crédito público ou incentivado”, propõe a CNI em seu comunicado.
A questão fiscal
As propostas da CNI aos presidenciáveis têm a responsabilidade fiscal como pilar. Para os industriais, o chamado arcabouço fiscal brasileiro (Lei de Responsabilidade Fiscal, resultado primário, regra de ouro e teto de gastos) “precisa ser mantido e fortalecido, para que a trajetória de dívida pública seja sustentável e os gastos do governo mais eficientes”.
Para a entidade, “eventuais retrocessos nas regras fiscais levariam à desvalorização do real e, consequentemente, ao aumento da inflação e da taxa de juros”.
O que dizem os presidenciáveis
Líder das pesquisas, Lula é crítico do teto de gastos. Em abril deste ano, o ex-presidente disse que a ideia foi fruto da incompetência governamental. “Faça o endividamento que você possa pegar. Se não tem [condições], não faça. Agora, quando você faz um teto de gastos e o único objetivo do teto de gastos é evitar dar aumento do salário (mínimo) e evitar fazer política pra melhorar a vida do povo, esse teto de gastos não vale. É por isso que eu sou contra o teto de gastos”, discursou o petista.
Apesar de comandar um governo que se define como liberal na economia, o presidente Jair Bolsonaro nunca foi um defensor incondicional do teto de gastos. No último dia 7 de junho, Bolsonaro disse que pode mexer em “algumas coisas” no mecanismo em um eventual segundo mandato.
O pré-candidato à reeleição lembrou que a própria equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, que é grande defensor do teto, já fez propostas de alteração no teto para colocar algumas despesas fora dele.
“Algumas coisas você pode mexer no teto de gastos, já [surgiram] propostas da própria equipe do Paulo Guedes. Mas a gente vai deixar para discutir isso para depois das eleições. Você poderia tirar alguma coisa do gasto obrigatório, poderia”, disse ele em entrevista ao SBT.
“Você pode ver: nós tivemos excesso de arrecadação no ano passado de R$ 300 bilhões. Não fizemos nada com esse recurso, foi para abater dívida interna nossa. Então, uma coisa ou outra você poderia mexer”, continuou.
O pedetista Ciro Gomes, que aparece em terceiro nas pesquisas, tem prometido acabar com o teto de gastos e taxar grandes fortunas como forma de arrecadar mais, caso ganhe a eleição. “Prometo acabar com essa ficção fraudulenta chamada teto de gastos e colocar em seu lugar um modelo que vai tocar o Brasil adiante sem inflação e com equilíbrio fiscal verdadeiro”, afirmou ele em janeiro, ao lançar sua pré-candidatura.
Candidata da terceira via, a emedebista Simone Tebet faz uma defesa mais enfática do teto de gastos. “Precisamos ter âncoras fiscais, porque sem responsabilidade fiscal você não faz social”, afirmou ela, em abril, em entrevista ao UOL.
Pontuando à frente de Tebet em algumas pesquisas, André Janones (Avante) ainda não se posicionou sobre o tema, mas costuma dizer que responsabilidade fiscal precisa andar junto com responsabilidade social.
Foto: José Cruz / Agência Brasil
Fonte: Metrópoles