Por um "cochilo" da base aliada, o governo foi derrotado na Comissão Mista de Orçamento (CMO) e não conseguiu votar a proposta que permite eliminar a meta fiscal de 2014. A oposição saiu vitoriosa, porque o governo não teve votos suficientes para cortar prazos e colocar o parecer do senador Romero Jucá (PMDB-RR) em votação. Pela manhã, a base aliada e a oposição haviam decidido anular a votação ocorrida na noite de terça-feira, quando o parecer de Jucá chegou a ser aprovado numa sessão tensa, cheia de xingamentos. Com a derrota, o parecer de Jucá só será votado na próxima semana, enterrando o calendário especial criado, que previa a votação para esta quarta-feira.
A derrota do governo ocorreu porque não houve quorum suficiente para encurtar os prazos e colocar o parecer em votação. Na sessão, Jucá apenas leu o parecer e encerrou a discussão. Mas, no momento de votação do requerimento para cortar o prazo de dois dias entre a leitura e a votação, não houve votos suficientes. O governo teve 15 votos, mas eram necessários 18. A oposição comemorou a vitória com risos e aplausos.
Jucá criticou a "cochilada" da base aliada.
— Não foi uma derrota. Foi uma cochilada da base aliada na Câmara. Poderíamos ter passado sem essa — disse Jucá.
Na terça-feira à noite, o parecer chegou a ser aprovado. Mas a oposição ameaçou recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a votação que considerou irregular, e o governo recuou. Pela manhã, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), se reuniu com líderes dos partidos governistas e da oposição e definiu que a votação de terça-feira seria anulada e que seria feita muma nova. A oposição prometeu não obstruir, mas, na prática, manteve os longos discursos.
O governo tem até dia 22 de dezembro para aprovar a mudança da meta no Plenário do Congresso, porque nesta data o Legislativo entra em recesso constitucional. Além do atraso na CMO, o governo enfrenta o problema de o Plenário do Congresso estar com a pauta trancada por 38 vetos presidenciais.
Jucá reclamou da falta de quorum entre os deputados. Os senadores da base estavam presentes.
— Não houve quorum necessário na Câmara. Faltou mobilização. Vamos retomar a votação na terça-feira. Não foi uma derrota, foi um atraso. Estamos dentro do prazo — disse Jucá.
O presidente da CMO, deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), anunciou o resultado, desconsolado.
— Eu sou o presidente, eu anuncio o resultado de que não foi aprovado o requerimento para quebrar interstício de dois dias — disse Devanir.
O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), aplaudiu e sorriu.
Ao apresentar novamente seu parecer, Jucá cobrou do governo "mais planejamento" para que essa possibilidade de reusltado negativo não ocorra em 2015.
— Para 2015, o governo precisa ter planejamento. Para não acontecer o que está acontecendo agora, no apagar das luzes. O governo não está acabando com a meta, o governo está ampliando a margem de abatimento da meta — disse Jucá.
No relatório, Jucá substitui a expressão "meta de superávit" por "meta de resultado", deixando claro que o governo pode ter resultado negativo este ano. A proposta permite o abatimento da meta de todos os gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e das desonerações. Hoje, o teto para o abatimento é de R$ 67 bilhões. A meta do governo central prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014 é de R$ 116,1 bilhões. O projeto altera a LDO de 2014. Como os valores que podem ser abatidos superam essa soma, na prática, o governo fica liberado para ter superávit ou mesmo um déficit.
Apesar do acordo, houve troca de farpas, era evidente a falta de entendimento. O clima de farpas foi mantido na sessão, embora de forma mais civilizada.
— Repilo a condição de mentiroso! Querem discutir na bola, vamos na bola. Tenho um limite na minha vida. Se vier com carinho, é mais dois palmos de carinho. Se vier com porrada, é mais dois palmos de porrada — reagiu Jucá, diante dos questionamentos de Izalci e de ser chamado de "mentiroso" pelo deputado Rodrigo de Castro (PSDB-MG).
A proposta que permite descumprir a meta de superávit só pode ser votada no Plenário do Congresso depois de limpar a pauta dos vetos. Diante da obstrução da oposição e do clima de guerra, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), adiou para a próxima terça-feira a sessão do Congresso.
O início da sessão da CMO desta tarde foi marcado por um pedido de desculpas de parlamentares do governo e da oposição pelos "excessos" na sessão da noite de terça-feira, marcada por bate-boca, gritos e xingamentos.
Jucá não queria o recuo, mas acabou sendo convencido.
— Ontem (terça-feira), tivemos uma reunião atípica, acalorada, que levou à aprovação do PLN e com questionamentos de que teríamos atropelado o Regimento. Depois de muitas colocações, tivemos um consenso: que a sessão não deveria ser anulada, até para não expor a CMO. Mas, tendo em vista certo tmulto. apesar do confronto, ganha na política. estamos convergindo na política, com uma solução - disse Jucá, acrescentando:
— Ninguém ganha na confusão. ganhamos na solução, na política não queremos esconder nada de superávit no meu relatório.
A CMO retomou a sessão às 15h, quando o clima ainda era ameno, de mea-culpa.
— Não quero dizer que estamos recuando, não acho que fizemos nada de errado — disse Devanir Ribeiro.
Já o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), pediu desculpas ao senador Jucá, por ter lhe arrancado das mãos o documento que ele lia na sessão de terça à noite.
— Quero pedir desculpas públicas. Não tinha direito de tirar o papel das mãos do senador. Se estabeleceu o caos em certo momento. O acordo foi no sentido de avançar, porque o governo tem maioria para aprovar basicamente qualquer matéria — disse Mendonça.
— Chegamos a um bom entendimento. O que vivenciamos ontem é o exemplo de algo que não deve ser repetido. Os excessos devem ser relevados — acrescentou o líder do PSDB na Câmara, deputado Antônio Imbassahy (BA).
MAIS GASTOS PARA 2015
Apesar do risco de ter déficit em 2014 e de crise econômica, o relator de receitas na CMO, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), apresentou na sessão da CMO um parecer em que aumenta em R$ 21,2 bilhões a previsão de receitas para 2015. Mesmo contrariando a equipe econômica, Pimenta fez isso para atender ao senador Romero Jucá (PMDB-RR), que é também relator do Orçamento da União de 2015. Esses recursos adicionais são sempre utilizados para arcar com as emendas parlamentares, sejam as individuais ou as coletivas.
Tradicionalmente, os relatores de receita elevam em cerca de R$ 20 bilhões as receitas, justamente para atender a demandas. Na prática, as novas aumentam os gastos na mesma proporção.
Fonte: O Globo