A primeira vez que o Estado brasileiro se estruturou sobre bases racionais para a formação de sua burocracia racional e voltada ao interesse público se deu na Era Vargas.
Até Vargas, havia verdadeiro caos na organização de carreiras e remunerações, para não falar nas formas de admissão: as oligarquias regionais da República Velha faziam do serviço público mero repositórios de seus interesses localizados, incapazes de refletir uma visão de projeto nacional. Com o Decreto-Lei nº 200/1967, a ditadura militar transformou o serviço público em atendimento político para seu interesse, relativizando a regra geral do concurso público, até para juízes e membros do Minnistério Público.
Somente com a Constituição de 1988 deu-se a tentativa transparente de se oferecer um serviço público longe da interferência dos governantes. Garantias como estabilidade, inamovibilidade e concurso público são armas contra o que se vê no presente momento, com o escândalo que atinge o Presidente da República e seus familiares no trato com servidores comissionados.
A PEC nº 32/220 trata da reforma administrativa e abre a possibilidade de criação de mais de 90 mil cargos comissionados, ao invés dos hoje 6 mil. A instituição do “vínculo de liderança” significará a presença de estranhos ao serviço público, em cargos comissionados que só podem ser ocupados por quem já demonstrou compromisso e excelência na área respectiva.
Ocuparão funções estratégicas para o interesse nacional. País nenhum do mundo democrático economicamente desenvolvido renuncia a sua estratégia de desenvolvimento. É o retorno de um atraso que se pretendeu superar culturalmente desde os anos de 1930. Demais, no texto da mesma PEC nº 32 inexiste qualquer referência a eventual economia de gastos com o serviço público.
Comentei apenas um dos muitos aspectos da reforma administrativa que se discute. Há outros pontos igualmente graves, como a permissão de pagamento de recursos humanos de empresas privadas com recursos públicos. São pontos estruturais que deixam evidente o perigo em que nos meteremos. Ante tão pessimista panorama, aos democratas de primeira hora só resta a alternativa do enfrentamento desta Reforma.
Martonio Mont’Alverne Barreto Lima Procurador de Fortaleza e professor da Unifor