A luta pela maior eficiência econômica é inerente à atividade empresarial em todas as partes do mundo, sempre incluída nessa batalha a questão da carga tributária, que igualmente é inerente à atividade econômica onde quer que se pretenda estabelecer um negócio não filantrópico.
Em geral, a temática tributária deve ter efeito neutro entre empresas e negócios que coexistam num mesmo mercado, sendo um primado da economia a vedação do efeito deletério da tributação sobre a livre concorrência. Pode-se dizer que isso é verdade na maioria do planeta, especialmente em economias maduras, ficando o embate concorrencial restrito às eficiências operacionais e produtivas em si.
Pois é, mas aqui em nossa peculiar Pindorama adoramos gestar excentricidades e a "logística tributária" é mais uma das chamadas jaboticabas que somente cá existem.
Diferentemente da atividade logística propriamente dita, cujo nome carrega o sentido, em que se busca a eficiência máxima no binômio custo e tempo, buscando alocar e posicionar geograficamente os recursos e produtos da forma mais prática e com foco nos melhores resultados para a empresa e maior satisfação de seus clientes finais, a logística tributária não tem lógica alguma, sendo mero efeito perverso de algumas das inúmeras distorções e teratologias de nosso atual sistema tributário.
A consequência prática, aliás, é exatamente oposta à racionalidade da logística em si, pois induz as empresas a posicionarem sua malha de armazenamento e distribuição segundo premissas que afrontam a lógica geográfica e a eficiência de transporte, unicamente para capturar "vantagens" estritamente tributárias originadas da guerra fiscal fratricida e da multiplicidade doentia das regras de tributação no segmento de consumo. Convivemos com 27 diferentes sistemas de tributação para o ICMS e 5.568 sistemas distintos para o ISS, colidentes e concorrentes ao mesmo tempo, induzindo as empresas a se organizar de maneira afrontosa à lógica e à racionalidade operacional.
Como um dos diversos exemplos dessa insanidade, muitos produtos são preparados em partes em alguns estados do centro-sul do país, levados à Zona Franca de Manaus para montagem final e terminação do produto final, de lá retornam a centro de distribuição em MG ou GO, sendo dali enviados para o consumidor final no Nordeste. São milhares de quilômetros de idas e vindas, a maciça maioria por via terrestre, consumindo e demandando de modo desnecessário a precária malha rodoviária, além da geração cavalar de poluição atmosférica pelo diesel queimado nesses trajetos.
Tudo isso por um único e sórdido motivo: ganhos fiscais decorrentes da combinação perversa de regras tributárias desarmônicas em relação ao ICMS. A distorção atual é tamanha, que a adição desses custos cavalares de transporte adicional ainda assim é vantajosa em decorrência dos ganhos tributários proporcionados pelas movimentações ilógicas.
Somente na perna final, entre a finalização do produto em Manaus e um consumidor do Ceará ou Rio Grande do Norte, por exemplo, cujo transporte lógico seria obviamente direto, uma mercadoria é trazida para um centro de distribuição em MG, aproximadamente 4.000 km distante, para dali ser finalmente enviada para Fortaleza (CE), por exemplo, com mais 2.800 km de rodagem rodoviária, quando o mais natural seria o envio direto, sendo 4.200 km por via rodoviária e havendo até melhores alternativas com transporte modal integrando fluvial e terrestre.
Sem entrar em detalhamentos técnicos, pois não é esse o objetivo dessa elucubração, esse trânsito físico irracional se explica pelo ganho tributário de, aproximadamente, 5% da carga fiscal final, com o manejo de alíquotas interestaduais e benefícios fiscais concedidos excessivamente nos últimos anos, pelos estados para atração de empresas e operações.
No campo do ISS a situação é semelhante, com a escolha de local para formalização ou mudança das sedes das empresas conforme vantagens de alíquotas do tributo, embora a discrepância geográfica não seja tão absurda como é nos casos do ICMS.
A nova sistemática da tributação do consumo, cujos pilares constitucionais foram aprovados por meio da Emenda Constitucional nº 132/2023, sinaliza uma drástica mudança desse panorama, primeiramente pela unificação das normas para todo o país, eliminando a multiplicidade de sistemas tributários, e posteriormente com a gradual redução e extinção dos benefícios fiscais concedidos de maneira indiscriminada, afrontando a livre concorrência.
Essas potencialidades ainda precisam de confirmação e efetiva materialização por meio das normas complementares que, provavelmente, serão debatidas e aprovadas ao longo desse ano no Congresso Nacional, mas a sinalização é bastante positiva e realmente gera algum alento em termos de haver um horizonte de esperança quanto à normalização e efetiva racionalização dos sistemas logísticos das empresas, tornando a organização das atividades econômicas menos exótica e guiada preponderantemente por motivos tributários. É realmente difícil imaginar que alguma empresa ou investidor estrangeiro compreenda e queira investir num ambiente tão confuso, irracional e doentio como esse atual.
As empresas terão um período bastante longo para se adaptar e reorganizar suas atividades até a integral implementação da nova sistemática. De início me pareceu excessivamente longo o período de transição sinalizado pelas normas constitucionais, mas realmente talvez seja necessário, tamanha é a distorção a que chegamos, não sendo razoável imaginar que alguém tão acostumado às muletas tributárias subitamente aprenda e consiga caminhar com suas próprias pernas.