A ideia que passou a ser avaliada pelo governo Jair Bolsonaro (PL) de conceder um reajuste linear de 5% aos servidores públicos federais criaria uma despesa adicional em 2022 que pode ir de R$ 3,3 bilhões a R$ 8 bilhões, segundo especialistas.
Haveria, assim, um estouro na previsão de R$ 1,7 bilhão que seria destinada às revisões salariais e demandaria uma abertura de espaço no Orçamento “quase instransponível” ou “impossível” dentro do teto de gastos, de acordo com avaliações colhidas ontem pelo Valor. Além de um custo fiscal alto, o reajuste estudado, muito abaixo da inflação, apontam, não resolve o problema estrutural e deve deixar os servidores insatisfeitos, resultando em mais pressões por recomposição salarial.
Para o economista Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o impacto do reajuste de 5% demandaria ajuste de cerca de R$ 3 bilhões líquidos no Orçamento, considerado um efeito inicial de R$ 5 bilhões e deduzidos a previsão já existente para as revisões salariais e o contingenciamento de emendas parlamentares. Essa discussão, diz, não é trivial e é “quase intransponível”.
Para ele, a discussão ainda está indefinida até mesmo na questão de mérito. Um reajuste linear de 5%, diz, pode deixar descontente parte dos servidores para os quais foi sinalizado um aumento maior, como é o caso das forças de segurança. Ao mesmo tempo, o reajuste geral pode sinalizar que há espaço para barganha ainda por outras carreiras, já que os 5% estão bem abaixo da inflação de 10,06% pelo IPCA em 2021 e as projeções para 2022 chegam a apontar taxas de 8%.
Nas contas de Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da Ryo Asset, o gasto adicional pode chegar a R$ 8 bilhões, em cálculo que considera os três poderes do funcionalismo federal e pode ficar ainda maior, diz. Caso também impacte os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, pode gerar um efeito cascata no judiciário nos Estados e Municípios.
Trata-se de um reajuste que não resolve o problema, diz Barros. “É enxugar gelo, já que esse tema irá voltar em 2023. Vai ter que pagar dobrado para por apenas um band-aid e não resolve o problema estrutural”, critica.
“Naturalmente, o governo tenta amenizar o risco de uma greve em pleno ano eleitoral, que pode ter impacto grande, a depender da categoria. Mas esses 5% não devem satisfazer os servidores, não resolvem a demanda de ninguém, e também não cabe no teto de gastos” , avalia o economista e professor da UFMG e diretor do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Frederico Jaime Junior. “É uma sinuca de bico impossível de ser resolvida, mas é algo impraticável dadas as regras do teto de gastos, algo que sabíamos desde que ele foi aprovado, em 2016.”
Juliana Damasceno, economista da Tendências e pesquisadora associada do Ibre, lembra que os servidores públicos ficaram com reajustes salariais desde 2020, por força da Lei Complementar 173, de 2020, que vigorou até dezembro do ano passado. A inflação acumulada de 2019 até fim de 2021 ficou perto de 20%, diz ela. E há parte dos servidores sem reajuste desde 2017, o que representa perda acumulada de 28,15%. “Um reajuste fiscal de 5% tem custo alto para o governo de Bolsonaro. Porque é um reajuste pequeno, que não agrada a ninguém, e tem custo fiscal alto, com desgaste político enorme.”
Na pior das hipóteses, avalia Juliana, o governo pode tentar classificar o reajuste como gasto extraordinário, mas há empecilhos para isso. O que também preocupa, diz ela, é que já há grande pressão por reajustes num momento em que as campanhas à presidência mal decolaram. À medida que a disputa se intensifica, pode aumentar a tentação do governo por aplicar políticas eleitorais que comprometam mais o quadro fiscal. Despesas com reajustes salariais, lembra ela, são permanentes.
Em boletim divulgado pela XP Investimentos, o economista-chefe da corretora, Caio Megale, aponta impactos para este ano e para 2023. Segundo ele, o reajuste pode representar despesa adicional de R$ 3,3 bilhões em 2022 se atingir apenas o executivo civil durante o período de seis meses. O valor sobe para R$ 8,3 bilhões em 2023, quando deve valer no ano cheio. Considerando todo o executivo, a conta sobe para R$ 5,6 bilhões, ainda considerando um semestre em 2002, e para R$ 13,1 bilhões no ano que vem. Os demais poderes representariam despesa de R$ 1,5 bilhão neste ano e R$ 3 bilhões em 2023, em iguais critérios.
Fonte: Valor Investe