O governo enviou ao Congresso o segundo Projeto de Lei Complementar para a regulamentação da reforma tributária, aprovada pela Emenda Constitucional 132, de 2023. Trata-se do PLP 108/24, em análise na Câmara dos Deputados, cujo objeto é o funcionamento do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), criado para substituir o ICMS e o ISS.
De acordo com a Constituição, competirá ao Comitê Gestor — entidade pública sob regime especial com independência técnica, administrativa, orçamentária e financeira — uniformizar a interpretação e a aplicação do imposto, arrecadá-lo, efetuar compensações e distribuir o produto da arrecadação entre estados, Distrito Federal e municípios e decidir o contencioso administrativo (art. 156-B, I a III).
A Constituição também determina que, na forma de lei complementar, estados, Distrito Federal e municípios sejam representados, de forma paritária, na instância máxima de deliberação do Comitê Gestor, sendo assegurada a alternância na sua presidência entre o conjunto dos estados e o Distrito Federal e o conjunto dos municípios e o Distrito Federal (art. 156-B, § 2º, I e II).
Quanto ao controle externo do Comitê Gestor — que será financiado por percentual do produto da arrecadação do IBS destinado a cada ente federativo — a Constituição diz apenas que ele será exercido pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios (art. 156-B, § 2º, III e IV).
O PLP 108/24 é extenso. Destaco os dispositivos que se ocuparam do controle externo do Comitê Gestor.
Lê-se no PLP 108/24 que “[o Comitê Gestor] está sujeito à fiscalização contábil, operacional e patrimonial pelo Tribunal de Contas do Estado ou do Município competente para apreciar as contas do ente federativo de origem do Presidente do CG-IBS” (art. 40, caput), o qual seria eleito “dentre os membros do Conselho Superior do CG-IBS, para o exercício da função pelo prazo de dois anos” (art. 16, caput).
A exposição de motivos do PLP 108/24 explica que a opção foi por “uma sistemática operacionalmente viável”.
A proposta, no entanto, é tudo menos viável. E de constitucionalidade duvidosa.
Qual seria o sentido da expressão “ente federativo de origem” do presidente do Comitê Gestor? Estaria ela se referindo ao ente federativo responsável pela indicação do membro do Conselho Superior? — se esse for o caso, como aferir o ente federativo de origem dos membros que representarão não um município, mas “o conjunto dos municípios e do Distrito Federal” (art. 8º, II)? Ou estaria ela se referindo ao local de nascimento do presidente? Ou, então, ao local do seu domicílio? Perguntas sem resposta.
Afora isso, a mudança a cada dois anos do responsável pelo controle externo do Comitê Gestor — prazo do mandato do presidente — certamente trará instabilidade e insegurança ao seu funcionamento — cada um dos 33 tribunais de contas tem jurisprudência e modo de funcionar próprios.
Se, conforme a Constituição, o controle externo deve ser exercido por estados, Distrito Federal e municípios, deve caber à instância máxima do Comitê Gestor (que representa as entidades políticas) realizar seu controle externo — tribunais de contas poderão auxiliar nessa tarefa.
Uma vez instituído, o Comitê Gestor terá diante de si desafios imensos. É fundamental que o Congresso Nacional ajuste o PLP 108/24 para evitar que falha de governança acabe prejudicando objetivos mais amplos da reforma tributária.