O secretário extraordinário de reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, considera positivo o resultado geral da regulamentação na Câmara e avalia que a trava para a manutenção da alíquota média do IBS e da CBS em 26,5% deve ser um dos temas mais quentes na discussão do PLP 68/2024 no Senado. Em entrevista ao JOTA, Appy afirmou que o Ministério da Fazenda seguirá com o papel de trazer subsídios técnicos para a discussão dos senadores e aponta que uma possibilidade é trazer propostas de medidas que serão adotadas caso a alíquota média ultrapasse o patamar limite.
A ideia é garantir que a trava funcione. O secretário avaliou ainda que o modelo de split payment foi aprimorado pela Câmara dos Deputados, que deixou o funcionamento do mecanismo mais claro. O sistema permitirá o recolhimento dos tributos e o creditamento no momento da liquidação financeira da operação. Para Appy, a percepção é que os deputados aprovaram de última hora muito mais concessões aos contribuintes, com ampliação dos benefícios, do que regras mais rígidas. No entanto, o governo ainda calcula o impacto dessas mudanças na alíquota.
Trava de 26,5%
O aperfeiçoamento da trava para a alíquota média de 26,5% do IBS e da CBS deve ser um dos principais temas de debate no Senado, segundo Appy. Aprovado na Câmara dos Deputados em 10 de julho, o PLP 68/2024 prevê que profissionais liberais e serviços de saúde e educação, entre outros regimes privilegiados, poderão ter o seu benefício reduzido se a alíquota média do IBS e da CBS ultrapassar 26,5%. A partir de uma avaliação quinquenal que será realizada com base nos dados disponíveis em 2030, o Poder Executivo poderá encaminhar projeto de lei ao Congresso Nacional para propor a redução de benefícios se a estimativa da alíquota superar esse patamar.
Desse modo, segundo o secretário, o governo poderá discutir com o Senado a substituição dessa previsão de envio de projeto de lei por parte do Executivo por uma definição clara de medidas que serão implementadas. “O ministro Haddad falou ‘olha, podemos eventualmente discutir se o Senado quiser substituir esse o envio do projeto de lei por uma definição clara de medidas do que que vai ser feito caso esteja sinalizando uma alíquota’. Seria uma antecipação para agora da análise do Legislativo sobre o tema”, disse. “Seria uma garantia de que, de fato, vai ficar nesse [patamar]”, analisou o secretário.
Appy explicou que, na prática, a trava poderia ser acionada a partir de 2032, mas não vê risco de até lá a alíquota superar o teto de 26,5% porque a reforma ainda estará no regime de transição. Do modo como o texto está hoje, explica, a redução dos benefícios dependerá da aprovação dos parlamentares. “Se o Congresso não aprovar, a alíquota vai ser superior a 26,5%”, disse.
Split payment
Appy considera que o maior aprimoramento que o PLP 68/2024 ganhou em sua tramitação na Câmara foi na técnica do split payment. Para o secretário, o texto deixou mais claro o funcionamento desses mecanismos, ao deixar evidente a existência de três tipos de split payment: automático, manual e simplificado, esse último mais voltado ao varejo.
Questionado sobre a crítica dos bancos de que o prazo é curto para que o split payment seja implementado em 2026, Appy afirmou que a Fazenda realizou reuniões preliminares com a Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF) e que, a partir de agosto, realizará um trabalho técnico permanente com o setor e avaliará o cronograma de implementação do mecanismo. O secretário observou, porém, que o split simplificado pode ser implementado mais rapidamente que o inteligente (ou automático). “[A gente] pode ir implementando aquilo que é tecnicamente mais simples no início e depois o que é mais complicado”, afirmou.
Para Appy, os ajustes no split payment podem ajudar a reforçar o impacto positivo que esse instrumento trará na redução do chamado “gap de conformidade”, que é a diferença entre o que se arrecada e o que se poderia arrecadar.
Ampliação nos benefícios
A avaliação do secretário é que, no momento final de votação do PLP 68/2024, a Câmara dos Deputados aprovou mais concessões aos contribuintes, que podem elevar a alíquota média do IBS e da CBS, do que restrições. O Ministério da Fazenda ainda calcula que impacto as mudanças terão na alíquota média. “A percepção geral é de que as mudanças que têm impacto de aumentar a alíquota têm impacto maior do que aquelas de reduzir a alíquota”, afirmou Appy. Em outras palavras, isso gera um viés de alta na alíquota, mas o secretário garante que ainda não foram finalizadas as contas após a votação dos deputados.
O secretário reafirmou a posição do Ministério da Fazenda de que é necessário ter o mínimo possível de tratamentos favorecidos, de alíquotas reduzidas, e de, em vez disso, se usar mais o regime de cashback. “Por outro lado, o que foi aprovado no Congresso [na Câmara] não descaracteriza o projeto, a espinha dorsal, que foi até aperfeiçoada, por exemplo na questão do split payment”, ponderou.
Zona Franca
O secretário afirmou que o governo ainda está avaliando o impacto das alterações promovidas de última hora na Câmara dos Deputados nos benefícios concedidos a empresas da Zona Franca de Manaus. Entre outras mudanças, o texto aprovado alterou a forma de cálculo do crédito presumido de IBS que será concedido à indústria incentivada da área. Segundo o novo texto, no artigo 446, parágrafo primeiro, esse crédito presumido será definido de forma a equivaler a dois terços do valor calculado mediante a aplicação de percentuais sobre o imposto apurado que variam de 55% a 100%.
De acordo com Appy, o projeto original enviado pelo governo previa a manutenção dos benefícios. Com as mudanças, ainda será necessário fazer cálculos para saber se houve ampliação dos incentivos. “O pessoal está fazendo as contas e vamos ter de avaliar, colocar os números na mesa. Eu acho que é um tema que, certamente, teremos de discutir com muita transparência com o senador Eduardo Braga”, disse.
Setor imobiliário
Appy elogiou a postura do setor imobiliário nas negociações da regulamentação, mas reforçou a posição de que o desenho aprovado não deve trazer grandes alterações de preços no setor. Para ele, a alta dos imóveis de alta renda não passará muito de 3% no fim da transição da reforma tributária, enquanto haverá queda de preços para a baixa renda. “O que é relevante? É que mesmo para imóvel de alto padrão, seja pela nossa projeção, seja pela deles, a diferença entre redutor de 40% e 60% dá um pouco mais de 3% do preço do imóvel. Então, no fim, estamos discutindo um efeito no final da transição que é de 3% no preço de um imóvel em um mercado em que os preços flutuam muito mais do que isso todo ano. Não vai ter nenhum impacto traumático para o setor. Mesmo se eles estiverem certos e a gente errado, o que acho que não é verdade, não vai ter nenhum impacto a mais para o setor”.
Além disso, reforça, o setor como um todo terá importantes ganhos de produtividade a partir da sistemática de não cumulatividade geral.
Cadeia do agronegócio
Appy avaliou que a tributação dos fertilizantes com uma alíquota do IBS e da CBS não vai gerar uma distorção no mercado na comparação com o sistema atual. Hoje, a alíquota de PIS e Cofins sobre esses tributos é zerada. Empresas do setor do agronegócio avaliam que a nova tributação pode elevar os custos em toda a cadeia e impactar a inflação.
O secretário, no entanto, avaliou que é preciso analisar outros fatores, entre eles a bagunça na legislação do ICMS nos estados, o que faz com que não fique clara a tributação que de fato incide sobre os fertilizantes. Ele ressaltou ainda que há cumulatividade na tributação na cadeia. Além disso, pelo modelo proposto no PLP 68/2024, se a empresa que adquire um fertilizante é um grande produtor, ela vai receber crédito sobre a tributação paga. Se é um pequeno produtor, o custo tributário será considerado como crédito presumido no momento em que ela vender os produtos.